Quem conhece o perfil profissional da Thaís Mule, no Instagram – Casa Dois Jardins – dificilmente acreditaria se eu dissesse que a primeira formação dela foi na área de Segurança do Trabalho. Mas é verdade: eu mesma fiquei surpresa quando ela me contou! “Essa escolha não foi minha. Eu sempre quis fazer História – era o meu sonho! No entanto, a minha ideia inicial era cursar a faculdade de Turismo. Pra mim, essa era a profissão que mais se aproximava desse universo histórico e cultural! Eu conseguiria unir o útil ao agradável: conhecer pessoas, viajar e ainda transmitir todo o meu conhecimento e a minha paixão pela História”, revela Thaís. Pena que sua família não pensava da mesma forma. “Meu pai não me incentivou a fazer faculdade de Turismo. Segundo ele, essa área não daria dinheiro. E como na época, Segurança do Trabalho estava em alta, meu pai sugeriu que eu fizesse um curso técnico no tradicional Centro Federal de Educação Tecnológica (CEFET), aqui no Rio, para depois conseguir um emprego na Petrobras”, conta. E foi exatamente isso que aconteceu: a Thaís acabou seguindo as orientações de seu pai.
Ao todo, foram três anos de curso. Assim que concluiu a formação técnica, a Thaís conseguiu um estágio na Petrobras. “O CEFET fica em frente a uma das unidades da empresa. Era como se o meu destino já estivesse traçado: sair do curso técnico e ingressar na Petrobras. Fui trabalhar como estagiária nos estaleiros, na construção de plataformas, em Niterói – cidade vizinha ao Rio. Foi um período bem difícil porque eu ia e voltava do trabalho chorando. Não aguentei. Quando faltava apenas 1 mês para o estágio terminar, eu pedi demissão. Meu antigo chefe chegou a me oferecer uma vaga de emprego, mas eu não aceitei”, relembra. O pai da Thaís, indignado com a decisão da filha, foi categórico: “ele me disse que caso eu não aceitasse a proposta de emprego, eu teria que me bancar dali em diante. Ele não queria pagar uma faculdade pra mim porque, na cabeça dele, eu já tinha feito um curso técnico. Portanto, já estava encaminhada e teria que dar conta do recado sozinha”, afirma. Mas a falta de apoio da família não intimidou a Thaís! Ela arregaçou as mangas e foi à luta! A meta – que logo foi atingida – era conseguir um emprego para pagar os seus estudos.
Não demorou muito, ela já estava fazendo outro curso técnico – desta vez, de Turismo – da forma como ela havia imaginado, lá no início! “Essa fase foi incrível porque eu estudava História da Arte e – por conta da própria grade curricular – nós fazíamos muitos passeios pelo centro histórico da cidade: o Rio Antigo!”, afirma Thaís. “Foi maravilhoso até o momento em que consegui uma vaga de estágio numa agência de viagens. Foi ali que eu me dei conta de que trabalhar com Turismo não seria nada daquilo que eu havia sonhado pra mim. Essas agências não são nem um pouco criativas! O meu trabalho se resumia a comprar passagens aéreas, imprimir boletos e fazer atendimento ao cliente. Depois dessa experiência, acabei desistindo do curso”, confessa.
Diante desse cenário, o plano B da Thaís foi “retomar” o que sempre havia sido seu plano A: ingressar na faculdade de História! “Naquela época, eu trabalhava na Gol, no Aeroporto Santos Dumont – durante o dia – e fazia faculdade de História, à noite, na Estácio de Sá. Infelizmente, eu me decepcionei mais uma vez. A universidade não estimulava muito a prática da pesquisa e os professores, ao invés de incentivar os alunos, só ficavam frisando os pontos negativos da profissão. Eu cheguei a fazer metade do curso mas, depois, resolvi desistir. Apesar de gostar muito de História – eu amo, na verdade! – não conseguia me ver dando aulas, lecionando. Eu adoro qualquer coisa que esteja relacionada à História mas, ao longo do caminho, descobri que não queria trabalhar na área”, explica Thaís. “Confesso que fiquei frustrada por um bom tempo: eu não estava me encontrando profissionalmente! Volta e meia eu me perguntava de onde iria surgir a minha verdadeira vocação”.
Perder-se também é caminho
Como dizia a escritora Clarice Lispector, “se perder também faz parte do caminho – é uma forma de se encontrar!” E a Thaís ainda teve que caminhar um pouco mais, até descobrir algo que realmente fizesse sentido pra ela. Justamente no período em que estava cursando a faculdade de História, a Thaís casou com o grande amor da sua vida: o Miguel. “A gente se conhece desde criança e começamos a namorar quando eu tinha 17 anos. Logo logo vamos completar oito anos de casados”, conta Thaís, com um sorriso no rosto. “A gente se casou no mesmo momento em que eu desisti de cursar História. E quando oficializamos a nossa união, eu saí da casa dos meus pais e me distanciei um pouco de toda aquela pressão familiar: de que eu tinha que me encontrar profissionalmente, de qualquer jeito! Foi um período mais tranquilo porque me permiti testar várias coisas e fazer cursos, sem compromisso. De qualquer maneira, a maior pressão sempre veio de mim mesma. Eu queria ter um trabalho que eu amasse! A sensação que eu tinha é que todo mundo fazia o que amava, menos eu!”, revela.
Um dos cursos que a Thaís fez nessa fase de experimentações foi de costura! A avó materna vivia costurando e, naturalmente, ela quis fazer um teste pra ver se esse poderia ser o seu caminho. “Eu gostei bastante, mas percebi que a costura me deixava tensa, porque sou muito perfeccionista. Quando comecei a me envolver mais com projetos e áreas que estimulam a criatividade, eu esbarrava sempre nesse problema do perfeccionismo. Se o resultado não ficasse exatamente como eu havia imaginado, eu desistia”, desabafa. Apesar dos desafios, ela não desistiu totalmente! A solução foi ajustar um pouco a bússola, ao longo do trajeto: “se eu não consigo costurar, pode ser que eu seja capaz de criar peças! Resolvi fazer o curso técnico de Moda, no Senac”, conta. “Eu segui em frente e concluí o curso, que teve duração de um ano”, afirma Thaís, toda satisfeita!
Após terminar o curso de Moda, a Thaís lançou sua primeira marca, junto com uma amiga. “A gente criou uma espécie de brechó: nós garimpávamos roupas usadas e depois transformávamos completamente as peças para revender. Essas duas vertentes – criação e consumo consciente – eram a base do negócio. A minha amiga costurava e o foco do meu trabalho era a criação, propriamente dita! Nós chegamos a promover um desfile e lançar uma mini coleção”, relembra Thaís. Mas a empresa não teve vida longa, infelizmente.
“A minha sócia e eu sempre nos demos muito bem, mas percebi que não tínhamos muita direção, como empreendedoras. E acredito também que estávamos em momentos de vida diferentes. Sem contar que eu tinha medo que o negócio pudesse atrapalhar a nossa amizade! O importante é que o brechó fosse algo divertido e que nos unisse, ao invés de nos afastar. A gente seguiu trabalhando por um tempo mas, depois, fomos desanimando e cada uma seguiu para um lado”, explica a empreendedora. “De qualquer forma, sou muito grata por essa fase da minha vida, porque o brechó estimulou muito a nossa criatividade”, complementa.
A resposta estava dentro de casa
Embora boa parte da formação profissional da Thaís tenha sido em instituições técnicas – como o CEFET e o Senac – ela teve, em casa, duas grandes referências quando o assunto era criatividade e trabalhos manuais: a tia e a avó materna. “Elas sempre me estimularam muito a criar – desde quando eu era pequena! Principalmente a minha avó, porque ela fazia de tudo: costurava, fazia crochet, tricô, cozinhava muito bem, tinha um monte de plantas em casa – era aquela avó bem típica”, conta a empreendedora.
Com o falecimento da avó, no final de 2016, a Thaís passou por um longo período de introspecção que, apesar de ter sido extremamente doloroso, foi o ponto de partida pra que ela encontrasse as respostas que tanto procurava! “Perder a minha avó foi muito difícil, até porque nós éramos muito próximas. Ela já estava doente há cerca de três anos por causa de uma fratura no fêmur. Mesmo assim, eu não estava preparada para viver sem ela”, afirma. “Eu fiquei perdida. Comecei a rever não só a minha vida profissional – parei pra repensar tudo! Entrei em depressão e quase não saía de casa. Cheguei a ficar uma semana, na época, sem colocar os pés na rua. A minha casa era o lugar onde eu passava a maior parte do meu tempo. Foi assim que eu comecei a mudar a decoração de cada cômodo, com bastante frequência”, relembra.
O apartamento do casal se transformou num verdadeiro “laboratório”, onde a Thaís testava diferentes papéis de parede, os mais variados tipos de revestimento e novas cores de tinta! Ela começou seus “experimentos” no quarto. Depois de ganhar um pouco mais de coragem e confiança, ela seguiu testando e aprendendo muito, nos demais cômodos da casa. “Só na parede do quarto, eu já coloquei adesivo, depois pintei de cinza; passou um tempinho, resolvi colocar cimento queimado – isso sem contar a fase do papel de parede de tijolinhos! Eu mesma assistia vídeos sobre decoração e projetos DIY (Do it Yourself – Faça você mesmo), no Youtube, aprendia o passo a passo e colocava a mão na massa”, explica. “Nessa fase de experimentação, me dei conta do quanto eu estava apaixonada por esse universo! Fiquei viciada em programas de decoração dos canais de TV a cabo, nas séries do Netflix e nos vídeos do Youtube sobre o tema!”, revela.
Assim que a Thaís percebeu o quanto amava decoração, ela decidiu ingressar na Faculdade de Design de Interiores, na Universidade Veiga de Almeida (UVA). Tudo começou bem, mas as aulas de desenho técnico a fizeram lembrar da época em que cursou “Segurança do Trabalho”, no CEFET. “Algumas matérias me deixavam nervosa – especialmente Desenho Técnico! Era como se eu estivesse revivendo aquela primeira experiência de anos atrás, quando eu tinha que fazer plantas baixas para identificar onde iríamos colocar os extintores e as saídas de emergência. Comecei a ter crises de ansiedade e, infelizmente, não consegui terminar o primeiro período. Foi difícil interromper a faculdade mas, em pouco tempo, resolvi dar uma segunda chance para essa área e pra mim mesma: eu retomei os estudos, porque o meu coração ainda não tinha se aquietado! Desta vez, me inscrevi no curso técnico de Design de Interiores, do Senac”, revela. “Eu cheguei a desistir de fazer plantas baixas, mas quero curar esse trauma – afinal de contas, nada é imutável nessa vida”, confessa Thaís.
No mesmo ano em que interrompeu a Faculdade de Design de Interiores, na Veiga, a Thaís fez outro curso – o Decola! Lab, da empreendedora Rafa Cappai – para se aprofundar nessa busca por um trabalho que realmente a fizesse feliz! E foi num momento de reflexão, durante as aulas, que a Thaís se lembrou, mais uma vez, de sua avó e da paixão que ela tinha pelas plantas! “Automaticamente, comecei a comprar mais plantas – tinham poucas, aqui em casa. Percebi que eu gostava muito de jardinagem também! Quando consegui ressuscitar um cacto – que hoje em dia está gigante – eu fiquei muito empolgada! Resolvi fazer um curso pequeno da Carol Costa, do Minhas Plantas – e foi a partir daí que eu me apaixonei de vez!”, afirma.
Através dessa conexão forte com as plantas, a Thaís teve a ideia de aliar duas grandes paixões, num negócio criativo que tivesse a essência dela: decoração e jardinagem. Foi assim que a loja online “Casa Dois Jardins” nasceu, no finalzinho de 2017! “Eu comecei a pensar em fazer e vender produtos que unissem essas duas vertentes! Até porque, hoje em dia, eu não consigo imaginar qualquer projeto de decoração sem plantas – mesmo que a pessoa não tenha muito espaço em casa para trazer mais verde para o ambiente!”, revela. Justamente por não conseguir dissociar uma coisa da outra, a loja acabou sendo batizada com esse nome. “A origem veio dessa ideia de que existem dois jardins mesmo – dependendo da casa e do estilo de vida de cada um: têm pessoas que gostam de plantas e podem ter um jardim em casa, mas não sabem cuidar muito bem; e existem outras que, apesar de gostarem muito de jardinagem, não podem ter plantas em casa, por falta de espaço. Então, através do meu negócio, eu ajudo as pessoas tanto a cuidarem das próprias plantinhas em casa, quanto a levarem mais verde para a decoração – por meio de objetos e acessórios – quando o ambiente é muito pequeno. Em tese, eu ofereço um jardim real e outro artificial, de acordo com a necessidade de cada cliente”, explica Thaís.
Negócio criativo com personalidade e muitas plantas
Depois percorrer um longo caminho até encontrar o trabalho dos seus sonhos, a Thaís está feliz e cheia de planos para o futuro! “Eu comecei a fazer um curso de desenho para superar o meu trauma dos tempos de CEFET e, claro, já pensando em desenvolver produtos a partir das minhas próprias ilustrações”, conta a empreendedora. “Eu mesma quero criar os produtos da Casa Dois Jardins! Não quero simplesmente revender objetos de decoração que podem ser encontrados facilmente em qualquer outro lugar!”, revela.
Em setembro, a Thaís começou a desenvolver uma logomarca para o seu negócio e até o final deste ano, a loja online já vai contar com produtos criados por ela! E as novidades não param por aí: “eu gostaria muito de investir num nicho específico – decoração de ateliês e espaços criativos! Aí sim, a jardinagem estaria presente em praticamente tudo: seja por meio de ilustrações, através do projeto de interiores em si ou, até mesmo, dando algumas dicas para empreendedores que querem trazer mais verde para o ambiente de trabalho”, explica a girl boss, com aquele brilho nos olhos de quem realmente encontrou a sua verdade.
Eu aprendi muito com a Thaís! A história dela só me fez ter mais certeza de que o Universo está sempre nos conduzindo – por mais que o caminho seja repleto de reviravoltas e inúmeros recomeços. De início, o trajeto até o “trabalho dos sonhos” pode parecer longo e distante mas, um dia, o “propósito” irá nos encontrar ao longo da viagem e tudo vai fazer sentido – acredite! Essa sensação – de estar no lugar certo, na hora certa – é maravilhosa e extremamente gratificante! Que a Thaís seja muito feliz nessa nova etapa e siga nos inspirando, com muitas flores no seu jardim!
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