Muitos anos antes de criar o projeto Inside the Office, eu já admirava o trabalho do designer e calígrafo mineiro Felipe Ambrosio. Já era cliente dele, inclusive! Eu adoro preencher cada pedacinho das paredes aqui de casa com fotos, artes e pôsteres, e não demorou muito pra que eu encomendasse um lettering do projeto Dizeres Imperfeitos para chamar de meu!
O Pil – como o Felipe é conhecido em Belo Horizonte – começou o Dizeres despretensiosamente nas redes sociais e, em pouco tempo, o projeto autoral se tornou a principal fonte de renda e de realização profissional desse designer, que encontrou no empreendedorismo o seu caminho.
Com apenas três anos de formado e muita história pra contar, o Pil já passou por agências de publicidade, escritórios de design e também foi sócio de dois empreendimentos, em diferentes momentos de sua carreira. Depois de muitas idas e vindas, o Felipe descobriu que trabalhar home office é, de fato, a praia dele!
Mesmo com pouco espaço para fazer as suas criações – atualmente ele dispõe de uma pequena bancada no quarto para desenhar, pintar e responder os e-mails dos clientes – o designer nunca se sentiu tão feliz! O motivo? Ele conseguiu conquistar algo que sempre sonhou: trabalhar com o que ama e ainda empreender a própria vida. Tem coisa melhor?
Nessa entrevista que fiz no home office do Felipe em BH, ele contou o caminho que percorreu até criar o projeto Dizeres Imperfeitos e ainda deu dicas para quem também quer investir no mercado criativo! Vem ver 😉
Felipe, como foi o início da sua carreira como designer gráfico? Você começou no mercado corporativo?
O meu primeiro estágio, na área de design, foi em 2007, numa agência de publicidade. Dois anos depois, fui contratado como diretor de arte – função que eu exerci, também dentro de agência, até 2010. Eu adorava a equipe e a minha rotina! Isso sem contar que existem, sim, muitos benefícios quando a gente trabalha para os outros. Se dissermos que não, estaremos mentindo! Temos um salário certinho todo mês, plano de saúde, ticket alimentação e, na maioria das vezes, trabalhamos em equipe – o que pode fazer toda a diferença, dependendo da área de atuação. Apesar de todos esses benefícios, o que me deixava mais chateado, no mercado corporativo, era ter consciência de que eu estava gerando muito lucro para a empresa, embora não estivesse sendo reconhecido financeiramente. Eu ganhava menos de mil reais, como estagiário, e depois, quando fui contratado como diretor de arte, o meu salário era de R$ 1.200,00 – valor que já era pouco em 2009! E ainda hoje, os profissionais que trabalham com direção de arte não ganham bem, aqui em Belo Horizonte. Ganha-se algo que dá pra viver. E isso, pra mim, era me contentar com pouco. Eu ficava frustrado. Foi a partir dessa insatisfação que eu comecei a investir mais na minha carreira, indo em busca de projetos autorais, que extrapolassem tudo o que eu estava acostumado a fazer em agências de publicidade.
Qual foi a sua primeira experiência como empreendedor?
A primeira vez que eu empreendi, de fato, foi com o meu amigo Pedro Ivo, que também é designer. Nós decidimos fazer alguns projetos juntos e, depois de um tempo, criamos o Estúdio Cabrones – que funcionou durante 1 ano e meio. O trabalho em si era muito legal, mas a gente tinha pouca experiência nas áreas financeira e administrativa. Nós tomamos muitas decisões erradas, nos estressamos bastante, mas continuamos sendo super amigos até hoje! Foi uma espécie de laboratório, um verdadeiro aprendizado! O Pedro chegou à conclusão de que têm outros caminhos para trilhar e eu me dei conta de que empreender é o meu caminho. Até pouco tempo atrás, eu não sabia exatamente o que eu queria fazer, mas já tinha consciência de queria ser o meu próprio chefe.
Como surgiu o projeto Dizeres Imperfeitos?
O Dizeres acabou surgindo por causa de um término de namoro. Um ano depois do Estúdio Cabrones fechar as portas, eu abri uma empresa com uma ex-namorada, que trabalhava com marketing. Mas quando terminamos o namoro, a sociedade também foi desfeita e a empresa deixou de existir. Para não ficar em casa chorando, resolvi fazer algo de útil – até mesmo para tirar o foco daquela situação. Logo em seguida, comecei a trabalhar com outro amigo, que tem um escritório de design aqui em BH. Foi a maneira que encontrei, na época, para tentar descobrir o que eu iria fazer dali pra frente. Estava completamente perdido e queria identificar o meu próximo passo. Como eu trabalhava apenas meio período, comecei a me dedicar ao lettering, todos os dias, na parte da manhã, antes de ir para o escritório. E foi assim que o Dizeres surgiu como um projeto autoral! Eu nem imaginava que ele se tornaria um negócio criativo, como é hoje. Durante os dois meses em que fiquei no estúdio do meu amigo, o projeto cresceu tanto, que só com o dinheiro que eu recebia das encomendas, já conseguia me sustentar. Mas eu acabei ficando tão sobrecarregado, que não conseguia render bem nem no estúdio e muito menos em casa, com o projeto. Eu sabia que tinha chegado o momento de tomar uma decisão! Optei por crescer profissionalmente junto com o Dizeres e não me arrependo! Acho que, na verdade, ninguém deveria se arrepender de ir em busca dos seus sonhos, mesmo que lá na frente não dê certo! Todo aprendizado é válido!
Em que consiste o projeto e por quê ele foi batizado com esse nome?
A proposta inicial era fazer letterings a partir de citações ou trechos de músicas. Eu já seguia o trabalho de escritores como o Pedro Gabriel, por exemplo, que criou o projeto “Eu me chamo Antônio”, e sempre me identifiquei muito com o impacto positivo que as frases podem gerar no nosso dia a dia. Como eu não sou escritor e nem redator, a minha ideia era simplesmente deixar essas citações mais bonitas visualmente, para que as pessoas tivessem interesse em compartilhá-las com os amigos, nas redes sociais. O projeto tem esse nome porque “Dizeres” se refere às citações, e “Imperfeitos” porque, na época, eu não fazia rascunho. Era tudo de primeira! Eu estipulei algumas regras, no início: fazer letterings a partir de citações – fossem elas famosas ou não; usar sempre duas cores; os mesmos materiais; e não fazer rascunho. Mas depois de sete meses de projeto, eu me dei conta de que o ideal seria fazer rascunho sim! Até porque o resultado final do meu trabalho fica muito melhor quando eu faço rascunho. Então era “Imperfeito” porque eu contava com os erros do handlettering, durante o processo de criação.
Letterings do projeto Dizeres Imperfeitos que foram feitos especialmente para o blog “Chata de Galocha”
O que foi mais desafiador pra você, até hoje, ao longo de toda a sua trajetória profissional?
A minha maior dificuldade não foi durante o Dizeres. Foi antes. O que mais me desesperou foi não saber o caminho que eu iria trilhar profissionalmente, logo depois do término do namoro. Rolou uma tela em branco, naquela época. O projeto pessoal, inclusive, foi a forma que eu encontrei para seguir em frente. Foi muito difícil pra mim ter que voltar a trabalhar para os outros, depois de desafazer mais uma sociedade. Eu já tinha passado por essa experiência três vezes – de ter um emprego formal – e sempre foi ruim. Eu me sentia derrotado. Mas valeu a pena porque eu não desisti! Acho que, se eu tivesse desistido e continuado a trabalhar para os outros, aí sim eu estaria numa posição mais infeliz – talvez eu nem tivesse descoberto a minha verdadeira paixão. Com o Dizeres, cada dia é um novo desafio! Através do projeto, eu tenho que pensar, constantemente, o que eu devo fazer para me manter relevante no mercado.
Como é trabalhar em casa? Quais dificuldades você costuma enfrentar no dia a dia?
Têm pessoas que dizem que trabalhar em casa não tem rotina, que você faz o seu próprio horário, mas não é bem assim! A gente tem horário sim, trabalhamos durante o horário comercial e cumprimos prazos. E, na maioria das vezes, trabalhamos até mais se comparado àqueles que têm um emprego formal. Hoje, eu trabalho mais, num ritmo bem mais pesado, mas tem rendido melhores frutos do que antes! Tem super valido a pena pra mim! Eu não consigo ser produtivo 100% do meu tempo, mas tento manter a minha produtividade em alta. Todos os dias eu cumpro as minhas tarefas e se esqueço de alguma coisa, por falta de organização, corro atrás para não perder o cliente ou deixá-lo insatisfeito. É sempre um desafio encontrar o equilíbrio: ou seja, a quantidade de trabalho que conseguimos colocar em prática, o que prometemos aos clientes e o que de fato iremos cumprir. Estou sempre em busca do equilíbrio! E atualmente, consigo organizar melhor o meu tempo. Aos finais de semana, por exemplo, eu só trabalho caso seja necessário finalizar alguma pintura ou marcar reuniões com clientes que têm uma agenda mais complicada de segunda a sexta. E também têm os meus workshops de lettering! Esses sim precisam ser aos finais de semana porque é quando a maioria das pessoas têm disponibilidade!
Fale um pouco sobre os seus workshops! Quantos cursos você já ministrou até hoje?
Esse tem sido o lado do trabalho que eu mais tenho gostado! A produção criativa por si só é bacana, mas confesso que transmitir conhecimento tem sido muito especial pra mim! Eu comecei a dar aulas por demanda e o primeiro workshop aconteceu em Juiz de Fora, no finalzinho de 2014. Fora esse, já rolaram quatro workshops aqui em BH, um em São Paulo e outro em Uberlândia. A partir de 2016, a minha ideia é levar o curso para outros estados do país.
Caneca com o lettering do projeto Dizeres Imperfeitos, que foi produzida em parceria com
a marca “Maria, a louça”, para a primeira edição da pop-up store Mooca, em Belo Horizonte.
Quais dicas você daria pra quem também sonha em se tornar um empreendedor criativo?
Eu daria quatro dicas que considero fundamentais:
- As redes sociais são indispensáveis! Tente sempre divulgar e compartilhar o seu trabalho na internet! Se você escreve, publique seus textos com frequência. Se você desenha, divulgue a sua arte! Faça o que você ama, ganhando dinheiro! Através das redes sociais, as pessoas vão ter a oportunidade de conhecer o seu projeto – seja ele autoral ou não. Se você tem um trabalho incrível, mas ninguém vê, é o mesmo que não ter um trabalho incrível. Hoje, querendo ou não, quem ganha dinheiro é quem é visto.
- Não se desespere! Saiba que nunca vai ter uma hora certa para começar! E se ficarmos esperando o momento ideal, ele nunca vai chegar! Sempre teremos incertezas e contas para pagar. Na verdade, incertezas vamos ter a vida inteira! A partir do momento em que nos tornamos empreendedores, deixamos de lado as certezas e o conforto da CLT.
- Participe de eventos relevantes na sua cidade! Se você é designer como eu, por exemplo, e quer conseguir freelas, mas não sabe onde captar clientes, a minha dica é: vá em eventos de startups! Aqui em Belo Horizonte teve a Startup Weekend e eu fui! O evento reuniu muitos empreendedores e investidores, mas tinham poucos designers: apenas três no total, contando comigo. Lá, eu tive a oportunidade de mostrar o meu trabalho, da melhor forma possível, porque a proposta do evento é justamente desenvolver um projeto, no prazo de dois dias. Fiz muitos contatos e consegui clientes. Ir em eventos relevantes do setor de design, no meu caso, é válido, mas não é o lugar onde vou conseguir clientes – no máximo, vou conhecer futuros parceiros. Por isso é muito importante saber onde você deve divulgar o seu trabalho, para ter um retorno satisfatório.
- Faça um cartão de visitas! Você pode perder boas oportunidades caso não tenha um cartão para divulgar o seu trabalho. Eu super recomendo que todo empreendedor ou profissional liberal faça o seu!
Quais livros você indicaria pra quem se interessa por lettering e caligrafia? E quais profissionais te inspiram, nessa área?
Eu indico dois livros: um deles é o “Elementos do estilo tipográfico”, do Robert Bringhurst, que é uma das publicações mais famosas da área. A leitura é bem agradável e o autor faz várias analogias entre música e tipografia, além de mostrar, em detalhes, os elementos das letras. Outro livro muito interessante é o “Sign Painters”, dos autores Sam Macon e Faythe Levone. Esse é pra quem tem interesse em saber mais sobre técnicas de caligrafia para produção de placas e letreiros. Já sobre os profissionais que me inspiram: eu admiro muito o calígrafo Jackson Alves, de Curitiba, e o Filipe Grimaldi, de São Paulo. Ambos são incríveis e também ministram cursos de lettering! Vale a pena conhecer o trabalho deles 🙂
E para conferir de perto os letterings lindos do Felipe, é só curtir a Fanpage e o Instagram do projeto Dizeres Imperfeitos!
Lettering que eu ganhei de presente do Felipe, no final da nossa entrevista!
Não é a coisa mais linda? Vai direto para a parede do meu home office 🙂
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